Ação cultural para o meio ambiente

De animal insignificante, quando surgiu na África há mais ou menos 70 mil anos, nós – homo sapiens – chegamos ao século XXI com a pretensa ideia de que somos os donos do planeta. Em muitos sentidos a revolução cognitiva (novas formas de pensar e de se comunicar) que ‘sofremos’, serviu tanto para agirmos em prol do nosso bem-estar quanto para praticarmos ações destruidoras nos nossos ecossistemas (HARARI, 2017). Apesar dessa análise bastante pessimista (e realista) do historiador Yuval Harari sobre nós, ele ainda pontua que nas últimas décadas fomos capazes de fazer alguma melhoria no sentido de atenuar essa realidade.

De certa maneira os desastres ambientais causados pela ação da natureza (tempestades, tsunamis, furacões etc.), àqueles causados pela ação direta do homem (bombas radioativas de Hiroshima e Nagasaki, explosão de Chernobyl; no Brasil: acidente radioativo em Goiânia, Barragens em Mariana e Brumadinho, derramamento de óleo nas praias do Nordeste do Brasil), estimularam a necessidade de políticas (acordos, protocolos e outros dispositivos legais) e ações (ambientais, educativas) de iniciativas privadas e públicas fazendo-nos avançar sensivelmente em benefício do meio ambiente. Levando em consideração de não termos mitigado todo estrago já causado.

No Brasil, apesar da falta de compromisso do Governo Federal com a pauta ambiental, de acordo com a última pesquisa (encomendada ao Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística/Ibope pelo Instituto de Tecnologia e Sociedade/ITS em parceria com a Universidade de Yale), a população brasileira demonstra está mais informada e consciente diante dos problemas ambientais. É significativo o número de brasileiros que se importam com o meio ambiente. Eles acreditam que o aquecimento global está em curso (92%), entendem ser a ação humana responsável por esse fenômeno (77%), identificam que as queimadas se intensificaram no Brasil nos últimos dois anos (82%) e ainda julgam que elas prejudicam a imagem do país no exterior (84%). Em contrapartida quando perguntados sobre quem pode contribuir nesse enfrentamento, os brasileiros estão bem divididos sobre essa responsabilidade: 32% apontam que são as empresas, 35% os governos e 24% os cidadãos. Esse resultado bastante dividido pode representar uma sabedoria subliminar do povo brasileiro de que só com ações conjuntas é que podemos ter um enfrentamento efetivo diante dos problemas ambientais.

No caso de Pernambuco, por exemplo, quando houve o derramamento de óleo, como é sabido o Governo Federal não colocou em prática o Plano Nacional de Contingenciamento para Derramamento de Óleo, previsto em lei.  Na época foi o governo do estado de Pernambuco, prefeituras, organizações não governamentais, associações, comunidades locais, grupos e amigos atuaram unidos para efetiva retirada do óleo. Somente após ação do Ministério Público Federal, o Governo Federal passou a cumprir, mediante coerção, sua responsabilidade prevista em lei.  É válido dizer também que até o momento, nenhuma empresa foi responsabilizada pelo crime ambiental ocorrido.

Situações de crise como essa necessitam de ações constantes e de uma consciência coletiva que incorpore na nossa prática cotidiana a utilização de dispositivos de ação conjunta previamente planejadas. Uma espécie de ação cultural para o meio ambiente. Entendemos que só assim pode ser possível minimizar esses impactos. Mas o que de fato seria essa ação cultural?

Para Paulo Freire (2006), que cunhou esse termo, significa que todo processo relativo à educação, seja ele de caráter instrucional (associado à escolarização) ou trate da formação humana (um processo inacabado, que acontece durante toda nossa vida) são significados através de ações (educação dialógica problematizadora através das palavras geradoras, dos círculos de cultura) no campo cultural. Especificamente se tratando da educação os objetivos pedagógicos seriam alcançados se pudéssemos atuar de forma a identificar no campo real e simbólico – cultura – produções que fazem sentido para determinada localidade ou grupo. Em se tratando do meio ambiente, as ações culturais também levariam em consideração esse campo real e simbólico que o homem produziu (produz) e que está presente na sua relação com o meio ambiente.

Nesse momento deve-se ter todo cuidado com a ação dialógica, para não ‘invadir culturalmente’ as localidades que se pretende promover a ação. Pois:

“Toda invasão sugere, obviamente, um sujeito que invade. Seu espaço histórico-cultural, que lhe dá sua visão de mundo, é o espaço de onde ele parte para penetrar outro espaço histórico-cultural, superpondo aos indivíduos deste seu sistema de valores. O invasor reduz os homens do espaço invadido a meros objetivos de sua ação”(FREIRE, 1983, p. 26).

Posto isso, nos inspiramos nessa ideia de ação cultural paulofreireana para nos alongarmos nesse texto, especialmente fazendo algumas considerações em torno das ações culturais que constituem a política pública de reflorestamento que vem acontecendo efetivamente em todo estado de Pernambuco: Programa de Reflorestamento de Pernambuco.

O aumento de temperatura, a emissão de gases, a erosão e perda de fertilidade do solo, perigo de desertificação, obstrução de rios e açudes, redução da biodiversidade, da cobertura vegetal e da água foram os problemas ambientais identificados no território pernambucano, que conduziram a Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade, desde 2020, atuar sistematicamente no Programa de Reflorestamento de Pernambuco (SEMAS, 2020). Trata-se de “um programa que visa orientar as ações públicas voltadas para o plantio florestal com a finalidade de manter e recuperar os ecossistemas em geral” (PROGRAMA DE REFLORESTAMENTO DE PERNAMBUCO, 2020).

É válido salientar que desde 2009 o governo do Estado tem investido na política ambiental através de ações como: plano de descarbonização da economia, fórum pernambucano, matriz energética, biocombustíveis, câmaras temáticas, consórcio nordeste, campanha “Race to race”, COP 26.

 

(Artigo completo em: SOUZA, Kelma F. Beltrão de; BERTOTTI JUNIOR, José Antônio. Ação cultural para o meio ambiente. In.: BRAYNER, Flávio. Cultura: os diversos usos de um conceito. CEPE: Recife, 2023. No prelo)

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